'O esporte está quebrando os limites da discriminação feminina', afirma Gerente Geral do Johan Cruyff Institute

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'O esporte está quebrando os limites da discriminação feminina', afirma Gerente Geral do Johan Cruyff Institute

Em entrevista, Mariël Koerhuis diz que " a profissionalização do futebol feminino aumentará ainda mais a visibilidade e o posicionamento das mulheres no esporte"

Porto Velho, RO -
O movimento de profissionalização do futebol é um caminho sem volta. Cada vez mais ligas, confederações e clubes têm buscado no mercado profissionais capacitados para atuar em seus quadros. E esse movimento abriu espaço também para cargos de gestão e chefia serem ocupados por mulheres, que sempre foram poucas, não só no esporte, mas no mundo dos negócios em geral.

Em entrevista ao Panorama Esportivo, Mariël Koerhuis, Gerente Geral do Johan Cruyff Institute, instituição especializada na profissionalização da gestão no mundo esportivo, conta que o esporte está quebrando os limites da discriminação feminina muito mais rápido do que qualquer outra área foi capaz de fazer até agora.

Koerhuis também disse que tem aumentado o número de mulheres buscando especialização ao redor do mundo. No caso do Brasil, por exemplo, ela recebeu uma turma da especialização em Gestão Esportiva da Trevisan, escola de negócios em São Paulo, para passar uma semana, no início de setembro, em Barcelona, tendo aulas no Johan Cruyff Institute. Entre os alunos, diversas mulheres.

As finais do Campeonato Brasileiro feminino tiveram mais de 40 mil torcedores em cada partida, um público impressionante para o país. Na fase final da última Champions League feminina o Barcelona colocou mais de 90 mil pessoas no Camp Nou mais de uma vez. Esse interesse é um fato atípico ou é um panorama de que a presença da mulher no esporte, tanto na prática quanto na gestão, está enfim sendo reconhecida?

Acho que é um sinal de que o futebol feminino veio para ficar. É um reconhecimento de muitos anos de luta árdua travada por jogadores, treinadores, árbitros, dirigentes, equipe médica, advogados, etc. tentando colocar o futebol feminino no lugar onde merece estar. 

É um sinal de que o público esportivo e, portanto, os patrocinadores, finalmente descobriram e reconheceram o futebol feminino por ser um esporte atraente, fresco, esportivo e tecnicamente desafiador de assistir. 

A profissionalização do futebol feminino tanto em campo quanto na gestão que o acompanha, aumentará ainda mais a visibilidade e o posicionamento das mulheres no esporte. Porque o futebol ainda é Rei, ou devemos dizer Rainha?

As mulheres estão conseguindo ocupar os espaços de gestão nos clubes ou ainda há dificuldades?

Ainda são poucas as mulheres em cargos de liderança no esporte, como é o caso dos negócios em geral. O esporte não é uma exceção a essa regra geral. É muito mais difícil para as mulheres subir a escada nos negócios esportivos do que para os homens. 

Como em outros campos da nossa sociedade, o esporte ainda é regido pelos homens. Uma mulher tem que trazer mais esforço, resiliência, educação, experiência e coragem do que um homem, e isso ainda é um grande desafio para muitas mulheres.

No entanto, estou muito otimista sobre o futuro das mulheres no esporte. Ao longo dos 17 anos em que tenho trabalhado no esporte, estou encontrando cada vez mais mulheres presidentes de clubes, gestoras de esportes, gerentes de patrocínio sênior, membros do conselho de clubes, etc. Hoje em dia, sou praticamente a única mulher em reuniões de gestão, e quase sempre foi assim no início da minha carreira no mundo do esporte.

A procura de mulheres por especialização em funções ligadas ao esporte ainda está concentrada na Europa ou já está globalizada?

Acontece que as mulheres na Europa não alcançaram um papel mais proeminente no esporte do que em qualquer outra parte do mundo (com exceção daquelas regiões onde o exercício do esporte por mulheres foi proibido por motivos religiosos). 

É surpreendente como em alguns países europeus, como o meu (Holanda), a presença de mulheres nos negócios (e, portanto, nos esportes) está no mesmo nível que em alguns países da América Latina e África, a saber: em minoria e de forma constante de crescimento. Há muitos exemplos de mulheres administrando esportes na África, Ásia e América Latina, tomando decisões em um nível muito alto.

E isso é surpreendente porque o papel das mulheres na sociedade em geral na Europa tem evoluído muito mais rapidamente do que em outras partes do mundo. Pode-se concluir que o esporte está quebrando os limites da discriminação feminina muito mais rápido do que qualquer outra área foi capaz de fazer até agora. Talvez seja porque o esporte é universal em essência e traz tanta emoção e paixão, rompendo padrões estabelecidos.

Como tem sido a receptividade das entidades esportivas em aceitar que cargos historicamente ocupados por homens passem a ter a liderança de mulheres?

Pela minha experiência, uma vez que um líder mostra profissionalismo, capacidade, força, confiança, bom senso e qualidade, não importa mais se é homem ou mulher. Gerentes homens subordinados a uma líder feminina competente não veem mais a diferença quando ela prova estar fazendo um bom trabalho. É certo que as entidades desportivas têm de ultrapassar preconceitos, porque ainda existem.

No entanto, as primeiras a superar esse preconceito são as próprias mulheres. Nunca me considerei uma mulher no meio esportivo, me considero uma profissional no meio esportivo, e sim, além disso, sou mulher, mãe e muitas outras coisas. Mas no trabalho, o que prevalece é o profissionalismo e a competência. Acho que se as mulheres no esporte tiverem esse tipo de atitude, a presença de qualquer líder feminina em uma organização esportiva será facilmente aceita e geralmente normalizada.

Você tem algum diagnóstico do desempenho das mulheres nessas funções de gestão? O resultado tem sido positivo?

Você teria me feito essa mesma pergunta sobre o desempenho dos homens em cargos de gestão? Acho que não… Em geral, acho que todos estamos muito focados nas diferenças entre homens e mulheres, ainda tendo que provar que a presença de mulheres em cargos de liderança no esporte é positiva para o bem-estar do esporte e sociedade. 

Acho que quanto mais diversos e de mente aberta somos, mais inovadores e disruptivos podemos ser como profissionais e como seres humanos. É disso que o mundo do esporte precisa, independentemente de ser governado por homens ou mulheres. Vamos fazê-lo juntos. O próprio Johan Cruyff sempre dizia: “Sozinho você não consegue, tem que fazer junto”.


Fonte: O GLOBO

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